terça-feira, 5 de outubro de 2010

Eleanor of Aquitaine: by the wrath of God, Queen of England‎

Para  Júlia, pelo seu aniversário (atrasado).

Nunca duvidei que nasci para reinar. Já era claro quando ainda era uma menina que nunca deixaria um mero garotinho tomar meu lugar. Eu era a herdeira, próxima duquesa da Aquitânia, futura Condessa de Poitiers, o melhor partido da Europa. Enquanto eu aprendia a toca o alaúde, já sabia que meus dedos eram de ouro, e que meu toque elevaria qualquer amado ao poder.

Então meu pai se foi, e veio Luís – pobre, fraco, adorável Luís – e eu o toquei com meus dedos dourados – de duquesa, de condessa, de poetisa; e logo ele tornou-se rei. Eu, Rainha da França, criei em torno de mim a corte que para sempre tornaria-se símbolo da realeza francesa: boa poesia, boa música, e todo romance possível. Tornei-me musa, e mãe de princesas, e montei em meu cavalo para libertar a Cristandade dos terríveis Mouros. Fui a cruzada como quem vai a um baile, e nela tudo ficou claro para mim: eu era Rainha, mas Luís, tão devoto, jamais seria O Rei.
E eu não poderia suportar mais tanta fraqueza, de forma que meus olhos fugiram rápido, os braços envolvendo o jovem e belo rapazinho que viria a ser o Duque da Normandia – Conde de Anjou, e ao meu toque, ele floresceu como homem e como guerreiro: cruzando o canal, tornou-se Rei. E eu, que fora rainha da França, recebi em minha bela cabeça a coroa da Inglaterra.

Meu belo Henrique, era um homem ativo, um homem apaixonante, e eu o amava com uma fúria irracional. Ele não era um fraco, e eu não podia dirigi-lo, e ele me fazia lembrar sempre de que eu era sua mulher – e que devia aceitar suas indiscrições. Adorava sua força, e odiava-o ao mesmo tempo. Tudo fazia ferver nossa rivalidade, e enquanto enchíamos a Ala Infantil de jovens e fortes crianças, ensinei-as no meu colo a odiar o pai.

Eu me refugiei com eles em meu belo ducado, e os ensinei sobre cavalheirismo, lealdade, força, e guerra: incentivei-os a lutar contra o pai, e com meu ex-marido, ameacei Henrique com uma luta que nunca aconteceu. Ele me castigou, é claro, pois diferente de Luís, nunca deixou que seus sentimentos levassem a melhor. E presa, isolada, eu passei tantos anos – pagando por retribuir sua traição.

Ele podia ter me cortado a cabeça, e eu nunca saberei por que ele não o fez; talvez temesse que jamais pudesse manter a Aquitânia, pois meu povo me era leal ao ponto de rejeitar meu amado filho, meu querido Ricardo, meu favorito. Eu tinha plantado bem demais a semente do ódio, e nosso herdeiro morreu lutando contra o pai, e meu marido morreu lutando contra nosso belo Ricardo.

Todos os homens que eu amei, tornaram-se reis, mas nenhum tão admirável quanto meu filho Ricardo; em seu porte majestoso e sua coragem cantada, em seu entusiasmo guerreiro, e sua lealdade que me libertou imediatamente para que eu recebesse a coroa em seu nome. Governei para meu filho enquanto ele refazia meus passos, levando a cruz a Jerusalém, sagrando-se o mais famoso comandante da cristandade, como seu pai um dia fora. Com minhas mãos fortes, segurei o império que lutei por, com e contra Henrique para construir.

E, ao fim, desejei que ele tivesse me cortado a cabeça, mas isso teria sido misericórdia demais. Meu coração foi arrancado com a força de um Leão enquanto uma flecha matava meu Ricardo, e com cacos de mim que vi meu caçula, João, subir ao trono da Inglaterra.
Não criei João, não o ensinei a lutar e odiar seu pai – Henrique cuidou disso, mantendo-o longe de minha cela, e ele criou-se um fraco. Talvez por isso tenha perdido a Normandia, a autonomia para os barões, a coroa e a vida ao fugir do neto de meu Luís, que vinha lhe tomar o trono.

Talvez tudo isso seja porque nunca o toquei.