quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

I Open At The Close

"Finalmente, a verdade. Deitado com o rosto pressionado contra o tapete empoeirado da sala onde uma vez pensara estar aprendendo os segredos da vitória, Harry entendeu afinal que não deveria sobreviver. Seu trabalho seria caminhar calmamente para os braços acolhedores da Morte. Pelo caminho, devia se livrar das ligações remanescentes de Voldemort com a vida, de modo que, quando se lançasse no caminho do bruxo, sem levantar uma varinha para se defender, o final seria limpo, e o trabalho que deveria ter sido feito em Godric’s Hollow estaria completo. Nenhum viveria, nenhum poderia sobreviver.
Sentiu o coração batendo furiosamente no peito. Como era estranho que em seu pavor da morte, ele pulsasse mais forte, mantendo-o vivo com valentia. Mas teria que parar, e logo. Os batimentos estavam contados.
Haveria tempo para quantos mais, no momento em que se levantasse e caminhasse pelo castelo pela última vez, saindo para o terreno e entrando na floresta?
O terror o inundou enquanto jazia no chão, com aquele tambor funerário batendo dentro de si. Doeria morrer? Todas as vezes que pensou que estava a ponto de morrer e escapara, nunca realmente cogitara a coisa em si. Sua vontade de viver sempre foi muito mais forte que seu medo da morte. No entanto não lhe ocorria agora tentar escapar, fugir de Voldemort. Estava encerrado, sabia disso, e tudo o que restava era a coisa em si mesma: morrer.
Se pudesse ter morrido naquela noite de verão quando deixou a rua dos Alfeneiros pela última vez, quando a nobre varinha de pena de fênix o salvou! Se pudesse apenas ter morrido como Edwiges, tão rápido que nem saberia o que acontecera! Ou se pudesse ter se lançado na frente de uma varinha para salvar alguém que amava... Agora até invejava a morte de seus pais. Essa caminhada a sangue frio para a própria destruição requeria um tipo diferente de bravura. Sentiu seus dedos tremendo um pouco e fez um esforço para controlá-los, embora ninguém pudesse vê-lo. Os retratos nas paredes estavam todos vazios.
Lentamente, muito lentamente, sentou-se, e quando o fez, sentiu-se mais vivo e mais consciente de seu próprio corpo do que nunca. Por que nunca apreciara o milagre que era: cérebro e coragem, e um coração pulsante?
Tudo isso seria perdido... ou pelo menos, ele se perderia disso tudo. Sua respiração ficou lenta e profunda,e a boca e garganta estavam completamente secas, mas seus olhos também.
A traição de Dumbledore não era quase nada. Claro que havia um plano maior. Harry simplesmente fora tolo demais para vê-lo, e percebia isso agora. Nunca questionara a sua própria suposição de que Dumbledore o queria vivo. Agora via que sua expectativa de vida sempre fora determinada pelo tempo que levaria para eliminar todas as Horcruxes. Dumbledore lhe deixara o trabalho de destruí-las, e obedientemente ele continuara a destruir implacavelmente os laços que amarravam não apenas Voldemort, mas a si próprio, com a vida! Que perfeito, que elegante não desperdiçar mais vidas, e sim dar a tarefa perigosa ao garoto que já estava marcado para morrer, e cuja morte não seria uma calamidade, mas apenas outro golpe contra Voldemort.
E Dumbledore sabia que Harry não tentaria se safar, que continuaria até o fim, mesmo que fosse o seu fim, porque se deu o trabalho de conhecê-lo, não é? Dumbledore sabia, assim como Voldemort sabia, que Harry não iria deixar ninguém mais morrer por ele agora que descobrira que estava ao seu alcance terminar tudo. As imagens de Fred, Lupin e Tonks jazendo mortos no Salão Principal forçaram a passagem de volta à sua mente e por um momento, mal pôde respirar. A Morte era impaciente...
Mas Dumbledore o superestimou. Tinha falhado: a cobra sobreviveu. Um Horcrux continuava a conectar Voldemort à terra, mesmo depois que Harry fosse morto. Verdade que essa seria uma tarefa mais fácil para alguém. Ficou pensando quem o faria... Rony e Hermione sabiam o que seria preciso fazer, é claro... esse seria o motivo pelo qual Dumbledore queria que ele confiasse em outros dois... de modo que se ele cumprisse seu verdadeiro destino um pouco antes, eles poderiam prosseguir...
Como a chuva numa janela fria, esses pensamentos tamborilavam contra a dura superfície da verdade incontestável, que era que ele tinha que morrer. Eu tenho que morrer. Isso tem que acabar.
Rony e Hermione pareciam muito longe, em um país distante. Sentia como se tivessem partido há muito tempo. Não haveria despedidas nem explicações, estava determinado a isso. Esta era uma jornada que não poderiam fazer juntos, e o esforço que fariam para detê-lo desperdiçaria um tempo valioso. Olhou para o relógio
de ouro surrado que ganhara em seu décimo sétimo aniversário. Já havia passado quase metade da hora de prazo concedida por Voldemort para sua rendição.
Ficou de pé. Seu coração saltando contra as costelas como um pássaro frenético. Talvez quisesse executar todos os batimentos de uma vida antes do fim. Não olhou para trás ao fechar a porta da sala."

Dia 11.

Nós mal nos vemos por anos, mas parece agora que isso quase não faz diferença. Pareceu, também, naquela outra vez, na última vez que nos falamos, que tempo nenhum tinha passado. Horas em silêncios confortáveis e conversas sussurradas. Sua voz era mais fraca, mas as palavras eram as mesmas.

Seu corpo tinha mudado completamente, mas o eu essencial não se perdeu, e nós falamos dos velhos tempos e de novas idéias. Eu esperei que você pudesse ter paz, sem entender que mesmo sofrendo, seu desejo de viver era tão mais intenso do que as limitações da sua dor. E você deu a eles mais um ano, não é mesmo? Você sempre foi forte, Andreia, o que me ajudou a ser forte. Você sempre fez o que precisava ser feito.

Eu aprendi muitas lições com você -- algumas, ditas sem palavra nenhuma. Me encantou com a História, e me animava com seu respeito. Era um modelo para todos nós, e ninguém entendia como aquilo tinha acontecido, mas virou mais uma de nós assim que eu sentei em sua mesa naquela festa -- mais de vinte anos atrás.

Em algum lugar aqui em casa tem um recado seu, no meu caderno de quinze anos, mas eu não vou procurá-lo. Ele vai me deixar triste, e você não gostaria disso. Aliás, eu nem estou triste: estou pensativa. Com saudades, claro -- eu a tive todos esses anos, sem conseguir pisar naquela casa feita de pesadelos infantis, então eu já quase me habituei a ela. A saudade faz parte, mas não é motivo para tristeza.

Você nos deixou na manhã de ontem, e fico feliz de ter ido te dar um último adeus -- um último alento -- segurar sua mão e cantar na minha voz quase perdida pedindo um feliz reencontro depois daqui. E quando entrei em seu quarto pela primeira vez -- pela última vez -- e vi a Mãe na tua cabeceira, te fitando, soube que estaria bem guardada em sua partida e em sua estada. E isso me deixa tranquila, porque foi exatamente como tinha que ser, nem mais, nem menos. A morte faz parte da vida, afinal.

Eu gostaria de subir entre as árvores para acompanhar tuas cinzas no último descanço, mas duvido que ele vá deixar -- ele não gosta muito de companhia, não é? Mas eu me fiz presente, e teria feito de novo, porque sei que seria isso que você quereria -- que fizessemos a coisa certa.

Espero tê-la feito.

Feliz Partida, minha querida.

(E eu sinto tanto orgulho de você)